O Poder 360 informa que o presidente da Câmara Arthur Lira (PP-AL) colocou a reforma eleitoral entre suas prioridades de votação no início de seu mandato. Há um grupo criado para estudar reforma da legislação, que deve apresentar plano de trabalho nesta 4ª feira (24.fev.2020) e uma comissão especial que deve ser criada sobre o assunto. As propostas discutidas pelos deputados até agora, caso aprovadas, deverão facilitar a vida dos partidos nanicos.
Os deputados falam em mudar a forma de eleição para cargos no Legislativo e também em afrouxar mecanismos que fizeram o número de legendas na Casa baixar de 30 para 24 nos últimos 2 anos.
A sugestão com mais receptividade entre os políticos que estão por trás do movimento é substituir o sistema proporcional de lista aberta, vigente atualmente, pelo chamado “distritão”.
Hoje, as vagas para deputado federal em um Estado, por exemplo, são divididas entre os partidos de acordo com a quantidade de votos que seus candidatos têm somados. Definidas quantas vagas cada sigla terá, assumem os mais votados na legenda.
Assim, se o PT consegue 8 das 70 vagas para deputado federal em São Paulo, os 8 petistas mais votados assumem. Pode acontecer de um candidato de outro partido ter mais votos que algum desses 8 e não ser eleito, caso os demais postulantes de seu partido tenham mau desempenho.
No distritão, assumem os mais votados, independentemente do desempenho das siglas. Essa modalidade de eleição enfraquece os partidos políticos.
A mudança será discutida em uma comissão especial a ser criada para tratar do assunto. “Hoje, o meu sentimento é que a Casa está pendendo para o distritão. Meu papel é construir um sistema de consenso para aprovação”, disse Renata Abreu, que participa das negociações, ao Poder360.
Para Lira criar o colegiado é preciso que haja uma PEC (proposta de emenda à Constituição) que inclua o assunto entre os seus temas já aprovada na CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) da Câmara.
Se os técnicos da Casa não encontrarem um projeto nessas condições, será necessária a apresentação de uma nova PEC e de análise pela CCJ antes de ser criada a comissão especial na qual Renata Abreu deve ser relatora.
O distritão interessa aos partidos pequenos porque, hoje, eles têm dificuldades para formar as chapas que disputam postos no Legislativo. Têm estrutura pequena e menos dinheiro para financiar campanhas.
Cada sigla pode lançar candidatos em número equivalente a 150% das vagas de cada Estado. Isso significa que no Rio de Janeiro, que tem 46 vagas na Câmara dos Deputados, os partidos podem lançar 69 candidatos, por exemplo.
As siglas podem registrar menos candidatos, mas se fizerem isso ficam em desvantagem. Legendas com mais candidatos têm, consequentemente, mais gente fazendo campanha. E pelo sistema eleitoral atual mesmo quem tem poucos votos ajuda o partido a conseguir cadeiras na Câmara.
Essa não é a 1ª vez que o distritão é cogitado entre deputados. Em 2015 o então presidente da Câmara Eduardo Cunha (MDB-RJ) tentou aprovar o sistema e foi derrotado. Posteriormente, Cunha foi cassado e preso.
“Se a gente tivesse que escolher o pior sistema no mundo, para piorar o que a gente tem, escolheria o distritão”, disse ao Poder360 o cientista político e pesquisador da FGV Jairo Nicolau.
Ele atribui a palavra “atraso” ao distritão. “Não é à toa que esse sistema era adotado em muitos países no século XIX antes da representação proporcional ser inventada. Não há casos de países relevantes usando”.
“O único benefício é que é fácil de explicar [como funciona para o eleitor]. Mas e daí? Uma coisa não é boa porque é fácil de explicar”, disse o pesquisador. Também seria, na análise de Nicolau, uma forma de promover o personalismo na política.
“No distritão você vai trazer pra cena muita gente que vai tentar a sorte. Já que a eleição depende só de você, por que você, presidente do Flamengo, radialista, cara da TV, outro do Big Brother, por que não vai tentar a sorte?”, questiona.
O pesquisador também disse que acha que a proposta sofrerá resistência dos partidos tradicionais e não será aprovada. Além disso, seria difícil quebrar a tradição do voto proporcional. “A gente usa representação proporcional desde 1945 com esse formato”, explica.
“Você imagina o crime organizado cercando uma favela e exigindo que seja votado determinado candidato. E esse candidato não precisa de legenda, não precisa nada, é um dos mais votados”, disse o presidente do PSD, Gilberto Kassab.
Segundo ele, eventual implantação do sistema acabaria com os partidos políticos.
“Acaba, porque você não precisa. São os mais votados. Pode ser candidato por qualquer partido pequeno. Mesmo grande, você vai ter compromisso com quem te elegeu, não vai ter mais ação partidária, não vai ter mais aquelas mensagens integradas com diretrizes, com propostas”, disse Kassab.
“Eu não conheço nenhuma democracia do mundo que não precise de partidos”, declarou o presidente do PSD.
Também está no radar dos deputados uma alternativa híbrida, aplicada no caso de Estados maiores, entre o distritão e o voto distrital –em que o eleitor escolhe, em eleição majoritária e circunscrições eleitorais menores, seus representantes para os legislativos.
Coligações
Também é ventilada a volta das coligações, vedadas para eleições proporcionais pela mesma regra, de 2017, que estabeleceu a cláusula de barreira. As coligações facilitavam partidos menores elegerem representantes porque todos os partidos da aliança somavam votos para a divisão das cadeiras em disputa.
As eleições municipais de 2020 foram as primeiras sem essa possibilidade. Como mostrou o Poder360, os partidos nanicos elegeram só 1,1% dos vereadores, ante 2,4% na eleição anterior. Efeito semelhante é esperado nas eleições para deputados estaduais e federais em 2022.
Está entre os assuntos discutidos pelos deputados, ainda, uma versão menos efêmera das coligações. “Nossa visão é antiga, a gente defende a federação de partidos”, disse o deputado Orlando Silva (PC do B-SP). Nesse sistema as siglas ficam associadas ao longo da legislatura, não só na eleição.
Jairo Nicolau disse à reportagem que o caminho da redução do número de partidos aprovado nas últimas reformas é bom e não deve ser mudado. Menos siglas deixaria mais fácil para o eleitor saber a linha política de cada legenda.
O pesquisador declarou que as últimas mudanças no sistema eleitoral são muito recentes para que novas alterações sejam cogitadas. “Antes de a reforma fazer seus efeitos… é como se você fosse fazer reforma numa casa e no meio da obra já está mudando”.
“A coligação na proporcional é uma excrescência do sistema político partidário brasileiro. A pessoa vota num candidato e acaba elegendo um de outro partido”, declarou. “Eu acho que é saudável [reduzir o número de siglas]. Com um número menor de partidos você consegue discutir melhor as questões dentro do Congresso”, declarou o presidente do PSD.
Os infográficos a seguir mostram como a os deputados se dispersaram entre os partidos ao longo do tempo: