Angieli Maros conta no Plural que em mais um dia com o total de casos confirmados acima de mil, Curitiba continua com a média de lotação das UTIs do SUS exclusivas para Covid-19 superior aos 90%. Os indicadores mais atualizados, desta segunda-feira (23), mostram ocupação de 90,3% no conjunto das vagas disponíveis nos 11 hospitais do sistema da Capital e da Região Metropolitana. Destes, dois – Erasto Gartner e Hospital do Trabalhador – estão com todos os leitos ocupados. Hospitais particulares também seguem cheios, três deles sem vagas. Neste ritmo, em que a falta de medidas mais rígidas de restrições dá tons de rotina normal à cidade, especialistas alertam para próximos dias e semanas bastante preocupantes.
Nas últimas 24 horas, quatro hospitais com leitos do SUS específicos para pacientes contaminados pelo coronavírus aumentaram a taxa de ocupação de leitos de UTI: Santa Casa; Hospital do Idoso; Hospital de Reabilitação; e Erasto Gaertner – este último chegando à ocupação máxima das vagas.
O Hospital do Trabalhador segue sem vagas, enquanto o Hospital de Clínicas (UFPR) e o Evangélico, que tinham nesta segunda 100% de ocupação, tiveram uma vaga liberada cada um. No Hospital São Vicente, a taxa é de 60%, e nos hospitais São Lucas do Parolin e do Rocio, em Campo Largo, na Região Metropolitana, as UTIs de Covid-19 estão com uso de 88% e 91%, respectivamente.
Acima de mil
Em outro indicador de aumento de pressão sobre o sistema, a Capital paranaense manteve, nesta terça, o número de casos confirmados de Covid-19 acima de mil. De acordo com boletim da Secretaria Municipal de Saúde (SMS), são 1.101 novos registros e 11 óbitos.
O aumento crescente vem se confirmando há cerca de duas semanas, período em que o município pulou de uma média de 300 para acima de 1 mil. Desde o início da pandemia, o recorde de confirmações em 24 horas é de 1.409, atingido na última sexta-feira (20) – mesmo dia em que prefeitura decidiu fechar a Unidade de Pronto Atendimento do Fazendinha para ampliar a disponibilidade de leitos de UTI e, assim, manter inalterados os indicadores para o nível mínimo de imposições à pandemia.
Para especialistas, no entanto, a estratégia de criar leitos de UTI sem restringir a circulação de pessoas está longe de ser eficiente. O próprio Ministério Público (MPPR) pediu que a Justiça julgue critérios adotados pelo município no monitoramento da Covid. Já a médica infectologista Viviane de Macedo, doutora em Ciências e professora do curso de Medicina da Universidade Positivo (UP), avalia que já passou da hora de Curitiba reavaliar suas diretrizes de isolamento, flexibilizadas há dois meses, e que, aos poucos, foram sendo cada vez mais deixadas de lado por uma parcela da população.
“Qualquer profissional de saúde e mesmo o cidadão comum, eu acho, também está esperando pelo fechamento da cidade, pela mudança de bandeira. E essa mudança não tinha que ter acontecido essa semana, semana passada. Na minha visão, que tenho acompanhado semanalmente os casos de Covid, tinha que ter acontecido há pelo menos três semanas, quando a gente passou dos 300 casos e foi evoluindo para um ascendente de casos”, afirma.
Segundo a médica, um planejamento focado em aumentar a rede de leitos só é eficaz se vier acompanhado de políticas que, na outra ponta, evitem a transmissão da doença e, consequentemente, a hospitalização dos pacientes mais vulneráveis ao vírus. Ao contrário disso, o prefeito reeleito Rafael Greca (DEM) fez um apelo à toda rede hospitalar metropolitana para que o total de vagas de internação seja ampliado, e as cirurgias eletivas, suspensas.
“Quanto mais adia [o fechamento], mais pacientes ficam doentes e mais pessoas vão a óbito. A redução de circulação de pessoas é o que faz a diferença, mas, andando pela cidade, a gente vê realmente que tem locais que não têm mais distanciamento entre as mesas nos restaurantes, não têm mais álcool na entrada. Foi afrouxando de uma maneira geral. Todo mundo cansado, mas o vírus não deixou de circular em Curitiba”, acrescenta a infectologista.
Particulares cheios
Na Rede Privada, o drama também cresce. Nesta terça-feira (24), o Hospital Marcelino Champagnat informou que não vai mais receber novos pacientes no seu Pronto Atendimento porque está, há mais de uma semana, atuando no limite de sua capacidade instalada. O fechamento é por tempo indeterminado.
Desde o dia 16, todos os 33 leitos do hospital destinados a pacientes com Covid-19 – sendo 15 de UTI e 18 de internamento – estão ocupados. De acordo com a própria unidade, na primeira quinzena de novembro houve um aumento de 44,5% de atendimento a pacientes no PA na comparação com o mesmo período do mês anterior. “Chama a atenção o crescimento dos pacientes com queixa de síndrome gripal – com um aumento de aproximadamente 128% nesse mesmo período”, diz o texto encaminhado pelo hospital, que afirma ainda haver um agravamento da situação ao longo dos últimos dias.
O fechamento para novos pacientes já havia sido anunciado no último domingo pelos hospitais curitibanos Nossa Senhora das Graças e Sugisawa. Os dois deixaram de receber casos graves, por causa da lotação máxima nas UTIs e demais unidades de internação.
Em vídeo gravado na noite desta segunda, o presidente do Sindicato dos Hospitais e Estabelecimentos de Serviços de Saúde do Paraná (Sindipar) e da Federação das Santas Casas de Misericórdia e Hospitais Beneficentes do Estado do Paraná (Femipa), Flaviano Ventorim, afirmou que a situação se repete em vários hospitais particulares da região, onde a ocupação de UTIs já está acima de 80%.
“Nos últimos dias, alguns hospitais têm falado sobre a sua dificuldade de giro de leito, ou seja, que as UTIs estão superlotadas. Temos que acompanhar esse movimento com muita atenção, pois os leitos de UTI estando cheios, a gente fica com dificuldade de atender a população”, disse o representante. “Nos últimos 15 dias, nós notamos um aumento do número de casos diários em todo o Paraná, Santa Catarina e São Paulo, os estados que são vizinhos ao Paraná. Isso nos preocupa muito.”
Resultado dos feriados
De acordo com a infectologista da UP, a onda crescente de casos em Curitiba também é resultado dos feriados do dia 12 de outubro e 2 de novembro – este último com movimento intenso nas rodovias que cortam o Paraná. No entanto, se a Capital paranaense seguir com uma rotina que facilita a transmissão do coronavírus pelas ruas, a especialista observa que a curva de registros tenderá a continuar em ascensão, mesmo que as próximas folgas coletivas sejam apenas no fim do próximo mês, as de fim de ano.
No último domingo, mesmo com UTIs já lotadas, a prefeitura inaugurou as festividades de Natal na cidade, alegando a importância dos eventos para o setor econômico e de turismo e defendendo a necessidade de “espalhar o espírito de paz, luz e de união entre as pessoas”. No concerto do Jardim Botânico, que ocorre até o dia 23 de dezembro, o público liberado foi de 1,1 mil pessoas.
“O que está pesando é a questão econômica, não tem outra explicação de por que a prefeitura ainda não fechou. É claro que o fim de ano é época que fatura bastante, mas muitas famílias na terão parentes para passar seu Natal. A gente tem visto todos os dias ou um paciente sequelado ou um paciente que vai a óbito, ou paciente que vai passar no hospital por conta de Covid. De uma forma ou outra, o feriado está prejudicado, mas vai ficar prejudicado fechando ou não o comércio”, finaliza Macedo.
A cidade já deveria ter adotado medidas mais duras.